Valores Retidos de INSS/IRRF do Empregado

Conforme se sabe, tem-se que, nos termos do artigo 22, inc. I da Lei 8.212/91, a Contribuição Social destinada a Previdência Social incidirá sobre as verbas destinadas a retribuir o trabalho, qualquer que seja a sua forma. Nessa toada, da análise da legislação conclui-se que estão excluídas da base de cálculo dos referidos tributos todas aquelas verbas que não possuem natureza retributiva, ou seja, que não constituam contraprestação pelo trabalho realizado.

Por certo, os valores de IRRF e INSS retidos dos seus empregados constituem tributos que são destinados aos cofres públicos pelo próprio empregador em nome de seus empregados, já que é dever do empregador efetuar a retenção da contribuição previdenciária devida pelos segurados/empregados, conforme art. 20, §1º da Lei 8.212/19911, bem como a retenção do Imposto de Renda em nome de seus segurados empregados no pagamento dos rendimentos provenientes do trabalho assalariado, conforme dispõe o art. 36 e 618 do Regulamento do Imposto de Renda (RIR) – Decreto nº 9.580/2018. Referida tese segue a mesma linha de raciocínio do emblemático julgamento do RE 574.706/PR (Tema 69), que definiu, em sede de repercussão geral, que os tributos não devem compor a base de cálculo de outros tributos – no caso julgado, o ICMS não pode compor a base de cálculo do PIS e da COFINS, isto porque o ICMS não constitui receita do contribuinte, mas, sim, do Estado, não devendo, portanto, compor as bases do PIS e da COFINS.

 Nota-se a semelhança entre os casos, uma vez que se busca o reconhecimento do direito à exclusão da contribuição previdenciária e IRRF em nome dos empregados da base de cálculos das contribuições previdenciárias, de terceiros e SAT/GILRAT, para que não haja incidência de tributos sobre tributos, tendo em vista que o rendimento bruto do empregado não corresponde à sua remuneração, tão somente o rendimento líquido (após as retenções legais).

Para fins de melhor entendimento e contextualização, cabe-nos examinar a fundo a tese. Vejamos:

 A Lei nº 8.212/91, em seu artigo 22, inciso I, tem a regra onde foi estabelecido o fato gerador da Contribuição Social destinada a Previdência Social cujo Empregador é o sujeito passivo (Patronal), o qual estabelece que esta incidirá sobre as verbas destinadas a retribuir o trabalho, qualquer que seja a sua forma.

 Portanto, os valores que compõem a base de cálculo da referida contribuição denominam-se “salário de contribuição”. Nessa toada, da análise da legislação conclui-se que estão excluídas da base de cálculo dos referidos tributos todas aquelas verbas que não possuem natureza retributiva, ou seja, que não constituam contraprestação pelo trabalho realizado.

 Por certo, como já dito, tais valores retidos (IRRF e contribuição previdenciária) dos seus empregados constituem tributos que são destinados aos cofres públicos pelo próprio empregador em nome de seus empregados.

As contribuições, independentemente de sua natureza, são tributos e, assim, devem obedecer aos princípios e regras tributárias constantes na Constituição Federal e no Código Tributário Nacional.

A contribuição patronal deverá incidir apenas sobre as quantias que efetivamente retribuam o trabalho, não cabendo incidência sobre verbas indenizatórias e, muito menos, sobre valores de tributos do empregado retidos pelo empregador, sendo esse o entendimento já pacificado pelo E. Supremo Tribunal Federal, no âmbito do RE 565.160/SC, Tema nº 20, em sede de repercussão geral. É dever do empregador efetuar a retenção da contribuição previdenciária devida pelos segurados/empregados, conforme art. 20, §1º da Lei 8.212/19911, e devem obedecer aos ditames da Portaria SEPRET nº 477/ 2021, Anexo II, bem como a retenção do Imposto de Renda em nome de seus segurados empregados, no pagamento dos rendimentos provenientes do trabalho assalariado, conforme dispõe o art. 36 e 618 do Regulamento do Imposto de Renda (RIR) – Decreto nº 9.580/2018.

 Portanto, não devem ser consideradas outras verbas que não as que tenham a finalidade de retribuição ao trabalho para incidências das contribuições, não devendo estar incluídas em sua base de cálculo os tributos do empregado cuja obrigação de retenção é do empregador. Esse, inclusive, é o entendimento aplicado pela 6ª Vara Federal de São Paulo ao analisar o caso semelhante no âmbito do Mandado de Segurança nº 5003989-39.2020.4.03.6100, em que se buscava a exclusão da INSS dos empregados da base de cálculo das contribuições patronais. Vejamos:

 

“Vistos, Trata-se de mandado de segurança, objetivando que seja reconhecido o direito de afastar da base de cálculo da contribuição previdenciária (cota patronal e aquelas destinadas às entidades terceiras) as verbas relativas aos valores retidos a título de INSS de seus empregados. Requer, ainda, a declaração de seu direito à compensação do indébito, relativo aos valores recolhidos indevidamente nos últimos cinco anos. (…) É o relatório. Decido. Inicialmente, anote-se que não se trata de impetração contra lei em tese, pois existe o fundado e concreto receio da exigência do tributo pelo Fisco com inclusão das parcelas que a impetrante entende indevidas, de forma que afasto a preliminar suscitada. Não suscitadas preliminares e presentes os pressupostos processuais e condições da ação, passo à análise de mérito. O fato gerador e a base de cálculo da cota patronal da contribuição previdenciária encontram-se previstos no art. 22, incisos I e II, da Lei nº 8.212/91 (…) As quantias relativas às contribuições previdenciárias devidas pelo empregado, não são “pagas, devidas ou creditadas” em seu favor, e sim descontadas de sua folha de salário, para serem repassadas aos cofres públicos. Assim, não há razoabilidade em incluir os valores retidos a título de contribuição previdenciária do empregado na base de cálculo da contribuição previdenciária paga pelo empregador, tendo em vista se tratar de valores sobre os quais os empregados não têm qualquer disponibilidade econômica, pois são quantias retidas na fonte por expressa disposição legal. Evidente, assim, que as contribuições previdenciárias retidas dos empregados não possuem natureza remuneratória, sendo indevida a incidência tributária. (…) DISPOSITIVO Diante do exposto, nos termos do artigo 487, I, do Código de Processo Civil, CONCEDO A SEGURANÇA, para reconhecer o direito da impetrante à exclusão, da base de cálculo das contribuições previdenciárias (cota patronal e aquelas devidas às entidades terceiras), dos valores relativos às contribuições previdenciárias retidas dos empregados. Declaro, ainda, seu direito à compensação dos valores pagos indevidamente até os últimos cinco anos que antecedem a impetração, com débitos relativos a quaisquer tributos administrados pela Secretaria da Receita Federal do Brasil, observadas as condições previstas pelo artigo 26 A da Lei nº 11.547/2007. A compensação, a ser requerida administrativamente, observará o disposto no artigo 170-A do CTN. (g.n)”          

O caso em questão trata apenas dos valores referentes às retenções de INSS. Contudo, a fundamentação utilizada se amolda ao caso e autoriza a exclusão das retenções do IRRF. Nesse sentido, também corrobora com o entendimento da impetrante a r. sentença exarada pelo MM. Juiz Federal da 13ª Vara Federal de Mina Gerais, no âmbito do Mandado de Segurança nº 1008208- 07.2018.4.01.3800:

 

“(…) DISPOSITIVO Ante o exposto, julgo procedente o pedido e concedo a segurança, revogando-se a decisão de Id 6957530 e extinguindo o processo com resolução de mérito, nos termos do art. 487, I, do CPC/2015, para: 1. determinar que a autoridade coatora se abstenha de incluir na base de cálculo das contribuições previdenciárias previstas no art. 22, incisos I a III, da Lei nº. 8.212/91 os valores retidos pela empresa a título de contribuição previdenciária do empregado e de Imposto de Rendada Pessoa Física (IRRF) que são creditados à União. (g.n)”

Frise-se, novamente, que os valores retidos de contribuição do empregado e IRRF tem natureza de tributo que são destinados diretamente ao erário público e, por isso, não podem se sujeitar à incidência da contribuição patronal. No julgamento do RE. 574.706, com repercussão geral o entendimento firmado pelo E. Supremo Tribunal Federal foi no sentido que “receitas que constituem meros ingressos não compõe a base de incidência”, nos termos da ementa abaixo:  

 

“EMENTA: RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM REPERCUSSÃO GERAL. EXCLUSÃO DO ICMS NA BASE DE CÁLCULO DO PIS E COFINS. DEFINIÇÃO DE FATURAMENTO. APURAÇÃO ESCRITURAL DO ICMS E REGIME DE NÃO CUMULATIVIDADE. RECURSO PROVIDO. 1. Inviável a apuração do ICMS tomando-se cada mercadoria ou serviço e a correspondente cadeia, adota-se o sistema de apuração contábil. O montante de ICMS a recolher é apurado mês a mês, considerando-se o total de créditos decorrentes de aquisições e o total de débitos gerados nas saídas de mercadorias ou serviços: análise contábil ou escritural do ICMS. 2. A análise jurídica do princípio da não cumulatividade aplicado ao ICMS há de atentar ao disposto no art. 155, § 2º, inc. I, da Constituição da República, cumprindo-se o princípio da não cumulatividade a cada operação. 3. O regime da não cumulatividade impõe concluir, conquanto se tenha a escrituração da parcela ainda a se compensar do ICMS, não se incluir todo ele na definição de faturamento aproveitado por este Supremo Tribunal Federal. O ICMS não compõe a base de cálculo para incidência do PIS e da COFINS. 3. Se o art. 3º, § 2º, inc. I, in fine, da Lei n. 9.718/1998 excluiu da base de cálculo daquelas contribuições sociais o ICMS transferido integralmente para os Estados, deve ser enfatizado que não há como se excluir a transferência parcial decorrente do regime de não cumulatividade em determinado momento da dinâmica das operações. 4. Recurso provido para excluir o ICMS da base de cálculo da contribuição ao PIS e da COFINS.”

 Considerando o entendimento firmado nesse julgamento, os valores que apenas transitam pelos registros contábeis da pessoa jurídica, mas que pertençam a terceiros, não constituem faturamento ou receita própria tal como ocorre com os tributos em geral. Esse entendimento pode ser aplicado ao presente caso, pois a contribuição previdenciária e o IR retidos em nome dos empregados consistem em tributos que devem ser repassados integralmente aos cofres públicos pelo próprio empregador e, por isso, não podem se sujeitar à incidência da contribuição patronal.

Nesse sentido, autorizar que os tributos retidos e repassados ao erário sejam incluídos nas bases de cálculo das contribuições patronais incorre em clara violação aos artigos 145, §1ª, 150, inciso I e 195, inciso I, alínea “a” e §4º, todas da Constituição Federal, além da contrariedade ao disposto nos artigos 97 e 110 do CTN e no art. 22, inciso I a III da Lei 8.212/91, gerando, assim, direito ao pedido de devolução pelo contribuinte.